Deficientes somos nós.

Não venho falar do Manel que partiu há dias. Não vou referir o facto de ele ser pouco mais velho do que eu e ter sido um caso raro de longevidade para alguém com Trissomia 21.

Não venho falar da sua eterna infantilidade e pureza, nem sequer da sua alegria.

Porque tudo isto foi profundamente dito nas suas cerimónias de despedida e no comovente livro que a família lhe fez, com páginas cheias de amor e ternura.

Venho falar precisamente, desta família extraordinária, os Castanheira.

O Manel foi o mais novo de oito irmãos, sendo que a sua mãe já passava dos quarenta, quando ele nasceu. E não podia ter tido maior sorte, por ser recebido neste mundo por um casal forte e unido, sobretudo uma matriarca, que teve coração suficiente para lhe proporcionar uma vida o mais normal possível e por ter sido capaz de passar o seu testemunho para os outros filhos.

E assim, após a sua partida, o Manel passou a ser filho dos irmãos e acolhido com o mesmo amor pelas suas mulheres e maridos, sobrinhos e apêndices, sobrinhos netos e os muitos amigos.

Não privei com o Manel, nem com a família Castanheira. Perdi-lhes o rasto ainda em criança. Mas agora, nestes dias onde o amor se espalhou como um raio de luz, chegou-me a tempo de presenciar a cerimónia mais bonita que alguma vez assisti.

O Manel foi amor, porque nunca lhe ensinaram outra coisa.

A família Castanheira, sem exceção, fez com que o Manel fosse uma eterna criança feliz, normal e tão bem acolhida por cada pessoa que com ele privou.

A sua despedida foi colorida de dedicatórias, músicas e vozes de uma beleza divina, todas, ou quase todas, da autoria desta família que não me canso de admirar. E nós, que tivemos o privilégio de os acompanhar nestes momentos, voltámos para casa com o coração um bocadinho maior.

E aprendi que a verdadeira deficiência é a falta de qualidade no amor que se dá e se recebe. Porque quando ele existe com esta dimensão, transborda e até a ciência se rende. E, no caso do Manel, Deus soube levá-lo com a delicadeza e ternura que ele tanto merecia.

Como gostaria agora de te ter conhecido melhor, Manel. Mas tenho o teu livro. Por isso, sempre que precisar de uma luz, saberei encontrar nestas páginas o teu exemplo e, acima de tudo, a estrutura sólida e profunda da família Castanheira.

Para todos eles, vai o meu abraço cheio de admiração e carinho.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *